❝ O canário de Viana, que canta o fado corrido, teve um predecessor no Porto
O canário de Viana do Castelo, que canta o fado corrido, há dias exposto num estabelecimento daquela cidade, não
é caso novo.
Houve, pelo menos, um, aqui no Porto, que cantava tam bem ou melhor do que ele. Foi o canário do sr. Francisco Silva, o estimado industrial de barbearia da rua Sampaio Bruno.
– Era um «bicho» de muita estimação, raçado de rouxinol. Viveu comigo dezoito anos
– uma vida! Nesse tempo entretinha-me muito a tocar guitarra. Era, mesmo, a minha
única diversão. O canário, apenas me via pegar no instrumento, ficava como doido,
aos saltos na gaiola. Tocava o fado. E ele, de cabecita ao lado, acompanhava-me, assobiando
com muita ternura. Uma inteligência!
O sr. Silva sublinha:
– Não, o caso não é novo, nem imprevisto. Ouviu alguma vez a opereta «O passarinheiro»?
Ouvia-a há muitos anos, por uma companhia Italiana. O tenor, quando cantava a valsa,
tirava da gaiola um canário – que o acompanhava com muito mimo. Era um sucesso.
Subitamente triste, a esmoer recordações:
– O meu canário morreu há muito. Mandei-o embalsamar. Não me queria desfazer dele.
O embalsamador, como o achasse muito lindo, vendeu-o para o chapéu duma senhora, trocando-mo
por outro de cor parecida. Dei pelo logro e reclamei. Escusou-se. Entreguei o caso
a um advogado, o sr. dr. Julio Gomes dos Santos, – e só desisti da questão quando, humilde, me veio pedir perdão.
– Queria assim tanto ao seu canário?
– Cantava o fado como ninguém – e foi um amigo como poucos. Um amigo barato – só comia
painço…